quarta-feira, 27 de janeiro de 2010

Para se tirar as folhas

Tudo muda quando se reage a paixões.
No riacho mais perto Maria pega água todo dia antes do sol começar. Filhos ela teve, dois foram pra cidade ganhar a vida e três morreram de peste. O marido foi comido pelo mato na caçada da última primavera, até hoje quando anoitece Maria canta na varanda de vestido e presilha de cores iguais pra esperar o Zé. Ela escuta os bichos da noite acordando na folhagem e aperta suas mãos secas contra o peito, (de novo) não era o Zé. Seus olhos fortes aumentam a solidão da terrinha desbotada que compraram anos atrás, antes não cabia, agora sobra tudo quando ela fuma de tardezinha. Banho de riacho frio antes de ir colocar o vestido que hoje é rosa fraco, tecido velho para esperar na varanda, engolindo o mundo. Não há um dia em que ela não pense no peso da violenta solidão que sustenta, ir embora não seria a solução, melhor ficar e preparar um café caso tenha visita.
Um silêncio confuso que se auto explica vira mar nos olhos até chegarem os urubus, tudo não passa, só seca e se decompõe para ser digerido no quintal.